domingo, 10 de abril de 2011

Silêncio das Mariposas, que acabou por silenciar-me também

Resenha de Elaine Moreira

Começar um livro com tal quantidade de confusão e verdade pode-se dizer é, no mínimo, ousado. As primeiras páginas de uma história ditam o que esperar de todo o resto. Caso seja fornecido muito suspense, drama, ou seja lá qual for o elemento literário, há de se imaginar que ele permeie todas as páginas prendendo o leitor até o ponto final. Nesse caso, 214 páginas depois.

Isso não é nada fácil de fazer. Mas também não é impossível. Juliano Schiavo que o diga.

O silêncio do título, não se faz apenas no ocultar a identidade da personagem central. Se faz também no silêncio quanto ao posicionamento geográfico. Não se sabe de onde vem, nem para onde vai. E sabe-se que os costumes regionais ditam muito das características de alguém. Até essa dica nos foi tirada para dificultar ainda mais a tentativa de descobrir quem nos conta sua história.

Mas há um contraponto para o silêncio. A verdade. A grande quantidade de verdade contida em todas as páginas, desde a primeira lição ensinada pela mãe, (que por incrível que pareça é a “necessidade de mentir” de iludir e encantar – o paradoxo da verdade da mentira). Eis o desnudar da sociedade, da hipocrisia vivida e imposta todos os dias e “revelada” com tanta naturalidade ao longo da narrativa.

Chamou-me a atenção ainda a sinceridade ao expor os medos. O medo de crescer, mesmo sendo necessário, o medo do “apagar eterno”, esse compartilhado pela grande maioria dos humanos, mesmo com tanto sofrimento, com tanta dor. Ainda assim, o medo. De morrer e do desconhecido.

A conservação das características primárias de um vampiro (aversão ao sol, sugar sangue humano, a caçada, o desejo, a sensualidade, a preocupação com o mistério, o não “revelar-se de Lúcio”), em uma onda literária de “adaptação de mitos”, com o contraponto da atualidade (o uso da Internet na busca pelas vítimas, por exemplo), são pontos destacáveis.

Não pude deixar de perceber o traço da Psicanálise, os sonhos revelando desejos reprimidos, para a busca dos que receberiam a “visita” do vampiro. Também não me escapou a frase “ nunca me tornei responsável pelo que cativei”, adaptada de um dos meu livros favoritos, O Pequeno Príncipe, em que Saint-Exupéry declara que sim, nos tornamos responsáveis pelas criaturas por nós cativadas.

Sorvi o livro aos “goles”, foi um por noite. E em nenhuma delas pude deixar de pensar se lá fora existia alguém que um dia me conheceu e que agora desejava o meu sangue. Também não pude me libertar da sensação de receber um beijo de Lúcio, toda vez que fechava o livro e me preparava para “dormir”.

Por cerca de dois meses vivi a vida noturna da criatura de Lúcio e criação de Schiavo. Sofri com seus dramas, ponderei os meus. Aprendi com suas verdades e questionei sempre o teor de suas palavras. Identifiquei-me, talvez essa fosse a intenção de não dar sexo a personagem. Ou talvez não houve intenção alguma.

Talvez tenha ocorrido só a mim, mas enquanto me “identificava” com a personagem, me questionei se não o fazia apenas para não ferir minha visão puritana e romântica de um possível relacionamento entre a criatura e Lucio. Talvez eu quisesse apenas que eles tivessem um relacionamento heterossexual. Pronto confessei. Também tenho os meus tormentos e limitações.

Mas isso é a história. Quero falar ainda da costura narrativa. Schiavo, com apenas alguns escorregões de repetição de palavras conseguiu fazer uma trama incrível. Desde o primeiro momento em que tive acesso a alguns capítulos do livro, no blog de divulgação, me encantou o conjunto de palavras, a riqueza descritiva na composição das cenas.

Sempre fui apaixonada por histórias de vampiros. Mas essa não é uma simples história de um vampiro. É uma história de palavras. De verdades e mentiras. De silêncios e gritos. De felicidades e tristezas. Descobertas e dramas. Do farfalhar de asas de mariposas e Cães melancólicos. Mas, sobretudo de Mariposas Silenciosas.

Venau

31/03/2011

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